quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Lar, doce lar

Morar sozinha é algo que desejo desde os 15 anos, mais ou menos, e que conquistei recentemente. O apartamento é modesto: pequenino e simples, mas é todo meu. No fundo, no fundo, é do dono, a quem pago o aluguel todo dia 15, mas durante algum tempo ele continuará sendo meu. Tentei arrumar companheiras para dividir as despesas, mas não houve quem se dispusesse, na época. Depois me acostumei à idéia de ficar sozinha mesmo e, agora, quem não quer dividir nada sou eu.

É bom e ruim ao mesmo tempo, porque às vezes dá pra sentir falta de companhia – sobretudo na hora de dormir. Para não sofrer desse mal, conto com meu namorado, naturalmente, que passa bastante tempo lá e, muitas vezes, dorme comigo; e com meus pais que, morando em João Pessoa, vêm constantemente me ver e passear no Recife. Tenho ainda três vizinhos (do total de oito) que conheci anteriormente, no trabalho. Porque quatro dos nove apartamentos do prédio são ocupados por amigos, carinhosamente apelidamos o condomínio de Melrose.


A mordomia com que começo esta nova etapa é fantástica. Ganhei praticamente tudo, da cortina do chuveiro à geladeira, das estantes ao microondas, do sofá às camas. E, instalada há menos de um mês, já posso dizer: nada como ter um espaço só seu, para arrumar – ou não – exatamente como quiser. Estou me sentindo brincando de casinha, numa casinha em que tudo é de verdade.

Ah, não esqueci outras visitas, não: parentes e amigos, claro, sobretudo oriundos das distantes Minas Gerais, que devem aportar por aqui (por favor!) principalmente no verão e, especificamente, no carnaval. Aguardo por todos, ansiosamente. Tragam colchonetes, um queijo minas e sintam-se em casa.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

O paraíso dos motoristas


O trânsito de Belo Horizonte, para mim, nunca foi dos melhores, mas, depois de vir morar no Recife, me dei conta de que o tráfego da capital mineira é uma maravilha. O trânsito do Recife é caótico. Costumo dizer que aqui é o paraíso dos motoristas, já que tudo é permitido. Invadir a contramão sem se preocupar com quem vem de lá; mudar subitamente de pista sem olhar para o lado e, claro, sem cogitar ligar a seta; parar na fila dupla, mesmo com vagas disponíveis; ignorar veículos com preferência... Tudo perfeitamente normal.

Há duas coisas, porém, que achei especialmente curiosas – e irritantes. Uma é o fato de que, aqui, usa-se a buzina para tudo. “Ó, estou atravessando um cruzamento”: fonfon! “Ô, da bicicleta, fica esperto que eu to passando”: fonfon! “Sai da frente”: fonfon! E tem ainda a impressão de que todos os motoristas, enquanto esperam o sinal verde (a não ser o primeiro da fila), ficam com a mão a postos para pressionar a buzina tão logo o sinal abra, como que para apressar quem está na frente e sem levar em conta aqueles segundinhos que gastamos para ver que o sinal abriu, engatar a primeira e sair. Mesmo se o carro do cara for o décimo da fila, o que implica que ele vai demorar um pouco mais a arrancar, ele está lá, pronto para buzinar imediatamente após o sinal ficar verde, como se isso fosse adiantar alguma coisa pra ele. E tem mais uma, que eu nunca tinha ouvido contar: as torcidas têm [vou aproveitar o têm enquanto posso] buzinadinhas específicas para identificar cada um dos principais times de futebol daqui (Sport, Náutico e Santa Cruz). Já consigo reconhecer a do Sport e a do Náutico.

O outro aspecto do trânsito recifense, e para mim o mais absurdo de todos, é a freqüência e a tranqüilidade com que os motoristas, numa via de mão dupla, posicionam o veículo à esquerda da faixa (podendo ou não invadir a contramão), param o carro em qualquer altura da rua, ligam a seta esquerda – ou não – e esperam calmamente uma brecha no tráfego da mão ao lado para entrar à esquerda, seja para fazer uma conversão, um retorno, estacionar em frente a uma loja ou entrar numa garagem. Enquanto isso, os carros que tiverem a infelicidade de estar atrás daquele desviam ou aguardam para poder seguir.

Eu fico abismada com esses comportamentos dos motoristas do Recife. Confesso abertamente que dirijo mal, sobretudo porque sou uma motorista recente e dirigi pouquíssimas vezes após tirar a carteira. Tenho ainda aquele receio natural de encarar o trânsito, e este daqui não está ajudando.

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

A passagem do som

De todas as artes, a música sempre me emocionou mais. Meu humor é diretamente influenciado pelo que escuto. Quando quero me alegrar, basta ouvir uma canção de que eu goste e pronto, resolvido. Da mesma forma, se ouço algo que me desagrada, o efeito é o contrário: fico irritada.

No meu primeiro show como assistente de produção, ficou mais evidente para mim meu amor à música. Cheguei cedo com o roadie, e levamos os instrumentos. Ele foi montando a bateria e ajeitando tudo para quando a banda chegasse. Depois vieram técnicos de som, de iluminação, e eu fui observando o palco tomar vida.

Microfones ligados, luzes no ponto, hora de passar os instrumentos. Cada músico toca um pouco, afina daqui, aumenta o som dali... Quando me dei conta, os acordes e batidas aleatórios haviam se unido na mesma música, formando uma levada uniforme. Naquele momento, algo aconteceu. O instante dessa percepção foi para mim o mais precioso do dia, mais até que o próprio show – excelente, por sinal.

Lembrei-me de horas antes, quando o palco ainda era apenas fios e caixas de som. Revi toda a montagem, pensando na sublime transformação que havia presenciado naquela tarde. Todo aquele quebra-cabeça de aparatos tecnológicos interligado com o mesmo objetivo: amplificar o alcance da música.

domingo, 12 de agosto de 2007

O gosto agridoce da verdade

A água é escassa. Saneamento básico não existe. Alimentos, calçados e roedores convivem a menos do que se pode considerar uma distância mínima: todos no chão, espremidos em cômodos apertados equipados quase sempre com beliches, nos quais dormem sobretudo mulheres e crianças. Os homens freqüentam as casas para freqüentar as donas de casa, que tiram dessas visitas o sustento da família.


Não, não estamos em nenhuma favela brasileira, nem no subúrbio das grandes capitais do país, tampouco na miséria sertaneja tão retratada no cinema nacional. Estamos em Calcutá, Índia, nos bordéis de uma região chamada Luz Vermelha, para a qual toda a cidade fecha os olhos, como se o nome do bairro indicasse mesmo que ali o acesso é proibido, quando, na verdade, a luz vermelha pisca como um alarme em pedido de socorro. Nascidos em Bordéis (Born into Brothels, 2004) não é ficção. É um documentário comovente com dosagem equilibrada de delicadeza e força.

A fotógrafa Zana Briski, que a princípio pretendia realizar um trabalho com as prostitutas dos bordéis, acabou encantando-se com os filhos delas. Iniciou um curso de fotografia com as crianças, entregou uma câmera simples a cada uma e, deixando-as livres para clicar o que quisessem, obteve resultados impressionantes. Simultaneamente, Zana esforçava-se para conseguir matricular os alunos em escolas de instituições internacionais, nas quais os pequenos artistas poderiam ter uma educação de qualidade e melhores oportunidades de trabalho, posteriormente.

É fácil compreender a mudança de foco da norte-americana: as crianças são mesmo encantadoras. São mais uma prova de que sensibilidade artística não depende de estudo e, muito menos, de berço. Além delas, todavia, o filme registra cenas impagáveis de um país que, embora não seja remoto e desconhecido, está longe de ter a cultura difundida. Conhecemos a pobreza em que vivem as famílias dependentes da prostituição; um pouco da crença e dos valores tão distintos do modelo ocidental a que estamos acostumados; as brigas entre as moradoras dos bordéis e até o pungente depoimento de um menino de 11 anos sobre o pai relapso viciado em haxixe. A edição é primorosa ao enxertar, ao longo do filme, belas imagens fotografadas pelas crianças.

A grande fragilidade do documentário, porém, talvez esteja justamente na exaltação do altruísmo da diretora. Há nobreza, claro, na iniciativa de ensinar às crianças uma técnica à qual elas dificilmente teriam acesso, na tentativa de resgatá-las do destino quase certo e na denúncia dos morosos e complexos processos para conseguir documentações e vagas nas escolas. Também ficam nítidas a boa intenção e a sinceridade das atitudes da professora. No entanto pode causar certo desconforto no espectador o fato de ser ela mesma a protagonista do próprio filme, tão dedicada, querida e exemplar.

Em vez de registrar a luta de um morador local ou mesmo de outro estrangeiro para ajudar as crianças, ou, em vez de uma equipe distinta filmar a rotina de Zana, Nascidos em Bordéis mostra a saga da própria cineasta. Essa autopromoção provoca estranhamento, incomoda, embora não chegue a tirar o brilho das crianças, verdadeiras protagonistas da história. A postura da professora, passível de críticas e louvores, reforça a dicotomia do filme, que em pouco mais de 90 minutos apresenta beleza e dor, expectativa e frustração, a doçura e o azedume da vida.

Recomeço

Três meses e oito dias depois... cá estou eu, de volta e com a promessa de não deixar morrer meu blog. Prometo para mim mesma, claro, porque leitores, leitores mesmo, devo ter uns dois, no máximo, que acessam isto aqui a cada mês, imagino, para conferir se continua abandonado. Pois bem: não continua.

E neste post-reinaugural decidi mostrar a fotografia vencedora do World Press Photo 2007, ou seja, a fotografia jornalística do ano, do norte-americano Spencer Platt. Basta dizer que são alguns habitantes de Beirute visitando uma parte da capital libanesa destruída pelos bombardeios israelenses... Já foi noticiado que não faziam “turismo de guerra”, eram apenas moradores de classe média da região procurando por parentes. Vai saber, né. Mas que a foto engana, engana.


sexta-feira, 4 de maio de 2007

Imprudência? Ou deboche mesmo?

Sobreviver, segundo o Aurélio, é continuar a ser, a viver, a existir. O advogado de Paulo Medina, Antônio Carlos de Almeida Castro, disse há dois dias que seu cliente, mesmo afastado do cargo, não poderia abrir mão do salário de R$ 23 mil porque não sobreviveria. Com esse termo, exatamente. Vi no telejornal e tenho testemunhas.

Desde então me pergunto: haveria colocação mais infeliz? Mais ultrajante? Mais ofensiva aos milhões de brasileiros e pessoas do mundo todo que sobrevivem, a duras penas, com menos de R$ 23 mil mensais? Não creio.

Será que o senhor Paulo Medina, mesmo com um salário tão alto, mesmo – [acrescento aqui a palavra “supostamente”, porque não quero complicações com a Justiça, tento ser cautelosa com o que escrevo e, ademais, não se pode confiar nesses juízes...] supostamente - cobrando fortunas para usar seu poder a favor de alguns, não conseguiu juntar um dinheirinho para sobreviver? Será que ele se esqueceu de considerar a possibilidade de sua – suposta – prática ilegal ser descoberta, e agora não tem como se recusar a receber o salário, caso contrário morre? Será que o ministro sofre da mesma imprudência do seu advogado? Ou é só deboche mesmo?

O senhor Antônio Carlos de Almeida Castro, como homem estudado (que certamente é) e cauteloso com as palavras (que deveria ser, sobretudo por ser advogado e advogado de gente importante que paga bem para se safar das sacanagens que faz), não pode dar-se ao luxo de cometer um deslize tão feio. Poderia ele ter dito que Paulo Medina não abriu mão do salário para manter o atual padrão de vida. Mas, não: Paulo Medina não sobrevive se não for com pelo menos R$ 23 mil depositados mensalmente em sua conta bancária. Ele deixa de viver, de existir. Ele morre.

Ele realmente deve admirar os miseráveis, aqueles que conseguem, não se sabe exatamente como, sobreviver com parcos R$ 350 - o salário mínimo, pelo menos para a maioria dos brasileiros – ou, muitas vezes, nem isso. O ministro deveria aproveitar a influência que tem (ou enquanto tinha) para sugerir o novo valor do salário mínimo do Brasil. Eu adoraria vê-lo explicar por que é impossível sobreviver com menos de R$ 23,2 mil por mês.

segunda-feira, 16 de abril de 2007

Eu fui!

Sabe aquele negócio de que todo mundo na vida deve plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro? Na minha lista, umas vinte coisinhas podem ser acrescentadas a essas três. E uma delas já posso riscar: eu fui ao Abril Pro Rock.

Quando via na televisão matérias sobre o festival, achava o máximo, queria muito conhecer, mas nem Pernambuco eu conhecia. Minha vontade era comparecer aos três dias, mesmo sem gostar de todas as atrações – a maioria eu nunca ouvi, na verdade –, mas, por motivo de força maior (sempre quis usar essa desculpa), uma viagem, especificamente, fui só na sexta, primeiro dia.

Calcei meus coturnos e fui ver os Mutantes. Sim, o principal show da primeira noite da 15ª edição do Abril foi dos Mutantes. E foi ótimo! Confesso que mais de uma vez tive vontade de chorar, emocionada por estar diante de uma banda (ainda que reformulada) revolucionária da música brasileira e que serviu e serve de influência para tanta gente. O show é lindo, a banda é ótima, a iluminação é perfeita, o Sérgio Dias é foda, o Arnaldo Baptista é louco, e a Zélia Duncan é inteligente.

Explico-me: o Sérgio parece o pai de todos, aquele que coloca uma certa ordem no negócio. Canta, toca guitarra, faz uns solos bacanas. O Arnaldo... Bem, o Arnaldo parece uma criança no palco, fazendo brincadeiras, alegre o tempo inteiro, como se estivesse em sua primeira apresentação. Quando a platéia gritou “Arnaldo! Arnaldo!”, fez uma expressão mista de timidez e felicidade, quase infantil, que me comoveu. Quanto à Zélia, pareceu-me humilde ali, consciente de seu papel, sem pretensão de substituir nem ofuscar ninguém. Julguei-a uma mulher de sorte. Pontos altos: “Ando meio desligado”, “Top top” e “Batmacumba”.

Outro showzão foi da Nação Zumbi, que não tocou nenhum sucesso da era Chico Science e ainda assim manteve o público empolgado o tempo todo. O que o APR tem de diferente, para mim, é a programação, que mescla poucos grandes shows com bandas menores e menos conhecidas; a estrutura bem montada no Centro de Convenções, com espaço para estandes, esculturas e até exposição de carros tunados; o público, diversificado, curioso, atento, tranqüilo (talvez porque eu não tenha ido à noite em que tocaram Marky Ramone, Ratos de Porão e Sepultura...); a história do festival, que valoriza bandas independentes, é eclético e democrático.

Destaque para a pipoca do DJ Popcorn, “a pipoca mais deliciosa que já comi em toda a minha vida”! Não haveria guloseima melhor para brindar minha estréia no Abril Pro Rock, na noite em que ele comemorou 15 anos.

sábado, 31 de março de 2007

Lost (my patience)

Há uns cinco meses eu não sabia nada sobre Lost. Aliás: sabia que é uma série de enorme sucesso mundial. Até que me emprestaram as duas primeiras temporadas e, como muita gente que assiste a algum episódio, fiquei viciada. Todo o tempo que permanecia em casa era para ver Lost. Havia, claro, a comodidade de ter todos os CDs à minha disposição e, portanto, não precisar aguardar uma semana – ou meses, no caso de final de temporada – para acompanhar o desenrolar de alguma cena. Depois de assistir aos 14 DVDs das duas caixas, fatalmente caí na angústia de esperar o início da terceira temporada e, hoje, assisto aos episódios poucos dias depois de terem sido exibidos nos Estados Unidos, graças ao sensacional esquema que me permite baixar arquivos de vídeo e legendas em (nem sempre bom) português, para matar minha curiosidade (o que nem sempre é possível também).

E é aí que se encontra a questão: não param de surgir mistérios naquela bendita ilha! Cada situação resolvida desencadeia outros novos suspenses! Só sei que eu, como telespectadora assídua, sinto muita falta de explicações. Há vários temas aguardando desfecho, como: 1) a fumaça preta monstruosa; 2) os ursos polares; 3) o caixão vazio do pai do Jack; 4) o projeto Dharma; 5) a relação entre a ex-mulher do Desmond e o submarino; 6) a presença dos Outros na ilha e o motivo pelo qual eles seqüestravam e matavam sobreviventes do desastre de avião; 7) a doença misteriosa que matou os companheiros de Danielle Rousseau; 8) a relação entre os sobreviventes, cujo passado os flashbacks mostram que está entrelaçado etc etc etc. Isso sem mencionar as inúmeras teorias malucas que aparecem sobre outros fatos e detalhes do seriado. Meu medo é de que, no fim, nada fique muito bem explicado, e os roteiristas inventem uma bobagem qualquer só para justificar essa bagunça.

segunda-feira, 26 de março de 2007

Caos desnecessário

Algumas coisas são óbvias demais para passarem batidas. Em várias cidades do país onde Chico Buarque já apresentou o show “Carioca”, as vendas de ingressos foram tumultuadas. Posso contar, com propriedade, a confusão que foi em Belo Horizonte, quando passei quatro horas na fila, tomando sol do lado de fora do Palácio das Artes. Enquanto isso, velhinhos que passavam por ali eram convencidos, por bagatelas, a comprar ingressos na fila preferencial; grávidas e vovós chegavam sem parar, dispostas a quebrar o galho de alguém; até um sujeito plenamente saudável eu vi chegar de muletas, só para ir direto à fila preferencial.

A minha epopéia de quatro horas foi até pequena, considerando que muita gente passa 14 ou mais antes de garantir o lugar numa noite de show. Mas, convenhamos, quatro horas para comprar ingresso, e vendo o começo da fila engordar, sem que o resto da fila ande, isso é... foda. Na última segunda-feira, dia 19, o público do Recife conheceu essa sensação. O que agrava a indignação de quem vivencia isso é a evidência de descaso por parte das produções, que com duas medidas simples poderiam evitar confusões desse tipo – bastava querer:

1. Contratar seguranças para, desde o começo do dia (começo mesmo, lá para as 5h), organizar as filas e impedir os furos;

2. Estipular um número (razoável) máximo de ingressos por comprador, como cinco ou seis.

O pior de tudo é ter consciência de que foi humilhado, desrespeitado, e ainda assim sair contente e feliz, confortado por saber que, dali a algumas semanas, vai assistir pessoalmente ao espetáculo que é “Carioca” e, mais que tudo, vai ver de perto, provavelmente mais perto que nunca, Chico Buarque.

terça-feira, 13 de março de 2007

Tem alguma coisa errada...

Uma pesquisa do Dieese em seis capitais brasileiras aponta que os trabalhadores do setor público ganham mais que os do setor privado e os autônomos. Ainda de acordo com o levantamento, a cidade em que os salários são mais altos é São Paulo, seguida de Porto Alegre, Distrito Federal, Belo Horizonte, Salvador e Recife. Enquanto um frentista de São Paulo recebe R$ 700 por mês, um do Recife ganha R$ 468.

Devo dizer que ainda não percebi nenhuma discrepância gritante na diferença do custo de vida entre BH e Recife. Mas será que, na comparação com São Paulo, também não há variação? Será que se o frentista paulistano recebesse R$ 468 ele conseguiria viver em São Paulo nas mesmas condições em que vive o frentista recifense no Recife?

Outra observação: todos reclamamos do governo federal, por um motivo ou por outro. Consideramos péssima a qualidade de vários serviços que o Estado deve nos prestar, sobretudo nas áreas de saúde, educação e segurança, enquanto nós não podemos deixar de pagar nenhum imposto e blá blá blá, velho discurso batido. Em contrapartida, muita gente sonha em trabalhar exatamente nessa instituição tão injusta e fracassada. Cursinhos com aulas específicas para concursos proliferam, a concorrência é cada vez maior e cresce também o número de pessoas que dedicam meses ao estudo a fim de passar num concurso público e ter garantido o (muitas vezes ótimo) salário e a aposentadoria. Mas não soa incoerente?

quarta-feira, 7 de março de 2007

Ah, o ócio (e a teoria bbb)

Ando tão sem inspiração que, vejam, coincidentemente só publico algo às quartas-feiras. Estou até pensando em padronizar isso, pelo menos enquanto a inspiração não vem. Um dos passatempos que adquiri, neste período de verme em que me encontro, foi o de assistir ao Big Brother Brasil 7. Ah, vai... eu me deixo cativar facilmente pelos mecanismos fajutos da televisão.

O fato é que notei algo: embora não tenha acompanhado todas as edições (na verdade, acho que só a primeira e, agora, esta), percebo que o desenrolar do programa não varia tanto assim, e o vencedor fica definido semanas antes do encerramento. Se houvesse bolsas de apostas para o resultado final do BBB, muita gente dividiria o prêmio principal. Quanto às eliminações semanais, não sei, são mais ou menos previsíveis de acordo com os componentes de cada “paredão”.

O que quero mesmo atestar neste post é a burrice dos participantes. Nunca entrei ali, não sei o que se passa na cabeça de quem lá está e, talvez, eu me comportasse como eles se estivesse na mesma situação. Mas fico indignada com a evidência de algumas coisas das quais eles parecem não se dar conta. Coisas do tipo:

- A pessoa ou o grupo mais excluído, ridicularizado ou subestimado pelos outros vai ganhar mais a simpatia do público, que vai sentir pena ou se identificar;

- Quanto mais isolado e depressivo ficar um participante cujos amigos foram eliminados, mais solidário será o público com ele;

- Quanto mais um participante for indicado para sair e, na votação do público, ficar, mais forte ele se tornará;

E por aí vai. A questão é: o comportamento se repete, e os vencedores sempre serão aqueles transformados em vítimas – e posteriormente em campeões – pelos demais integrantes cegos o suficiente para não vislumbrar esse processo.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

O mistério de Fátima

Gente, é impossível não notar o cabelo da Fátima Bernardes!

1. Eu sou mulher. Observo essas coisas.
2. Eu sou um ser humano que tem momentos de futilidade como qualquer outro.

Voltando ao assunto: nos últimos dias, o cabelo dela está muito esquisito, cheio, armado e com as pontas espetadas. Uma mulher que: tem dinheiro de sobra para deixar o cabelo maravilhoso; trabalha numa emissora que prima pela qualidade – pelo menos estética – de seus produtos e aparece cinco vezes por semana na casa de milhões de brasileiros em horário nobre, no telejornal mais importante do país, deveria ter um cabelo no mínimo fabuloso.

Há algum tempo, se não me engano nos primórdios da escova progressiva, criou-se um bafafá em torno do cabelo dela, que havia mudado de repente. Desta vez, eu nem sei especular o que pode ter sido. Parece escova mal feita, quando as pontas ficam duras e o cabelo fica cheio. Quero ressaltar que gosto dela, considero-a muito simpática e competente. Mas que tanto ela quanto a produção estão sendo infelizes no penteado dos últimos dias, isso, estão.

Redução uma ova

Toda vez que algum menor de idade participa de um crime cujas proporções chegam ao patamar a que chegaram as proporções do caso do menino arrastado por sete quilômetros, alguém volta à tal redução da maioridade penal. Sou radicalmente contra.

Sei que alguns garotos de 16 e 17 anos podem ser piores que muitos bandidos experientes, mais cruéis e impiedosos. Sei que “se um menino de 16 anos pode eleger um presidente, ele pode pagar pelo que faz”, como alega a maioria dos que defendem a medida. Claro que deve pagar pelo mal que faz, mas não em condições subumanas. Dirão que não foi humano também o que fizeram à criança, mas ainda acredito que não se deve apresentar a um adolescente, por mais grave que sejam os crimes cometidos por ele, o sistema carcerário podre do Brasil.

A questão é: não adianta tapar o sol com a peneira, adotando medidas paliativas sem atingir o cerne do problema e fingir que vai resolver. Todo mundo sabe que neste país boa parte dos governantes toma providências a curto ou médio prazo, sem investir corretamente na melhor solução, sem cortar o mal pela raiz. O buraco, plagiando João Ubaldo Ribeiro, é abissalmentissimamente mais embaixo.

Acho que os adultos sofrem com essa bagunça que se tornaram os presídios brasileiros. Superlotação, maus tratos, péssima infra-estrutura etc. Eu sei, eu sei que há detentos que recebem celular, droga e pizza. Também por isso acho infinitamente mais urgente construir presídios e reformar toda a política desse sistema (incluindo cursos de alfabetização e profissionalização em todas as unidades), em vez de simplesmente aumentar a população carcerária com meninos que dificilmente se recuperarão naquele ambiente (afinal de contas, o objetivo da detenção não é apenas punir, mas também devolver o “elemento” “recuperado” à sociedade?). Aí, então, fará sentido discutir redução de maioridade penal.

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

O melhor do carnaval

Não tem jeito: para mim, o melhor do carnaval de Pernambuco é o bloco Quanta Ladeira. Existem o Galo da Madrugada; as troças e os bonecos gigantes de Olinda; o povo brincando nas ruas, fantasiado, como na minha cidade eu só via crianças curtindo em bailinhos de clubes fechados; grandes shows no Marco Zero e até o Rec Beat. Mas nada disso – para mim, reitero... – se compara à união de grandes nomes da MPB para cantar versões despudoradas de sucessos variados. Só vendo o Quanta Ladeira em ação para acreditar.

O bloco, que em 2007 completou 10 anos, se apresenta no espaço do Rec Beat, sempre na tarde do domingo de carnaval. Fazem parte dele Lenine, Zé da Flauta, Lula Queiroga e Silvério Pessoa. Costumam participar também alguns artistas que estejam no Recife para fazer shows incluídos na programação do carnaval e outros convidados. Neste ano, o Quanta contou com Pedro Luís, Roberta Sá, Elba Ramalho, Bráulio Tavares, Morais Moreira, Zé Renato, Arnaldo Antunes e outros. Alguns temas foram: Denny Oliveira (apresentador de TV acusado de abuso sexual contra adolescentes), Rede Globo, Prefeito do Recife (que reajustou em 47% o próprio salário. Detalhe: o prefeito João Paulo estava lá assistindo ao show), Daniela Cicarelli (que apareceu em um vídeo... ah, vocês sabem) etc etc etc. Como o blog é meu e quem decide o que é ou não impublicável sou eu, eis alguns fragmentos de que me lembro:

“Quanta ladeira, Olinda, Quanta ladeira...”
(Hino do bloco, versão para “Guantanamera”)

“Fui na rua dar uma bola / Arrumar o que fazer
Encontrar com meus amigos e ir prum bar pra beber
Arrumar umas vagabundas e botar pra f****
Chego em casa e dou um pau, se a mulher encher
Se a mulher encher
Se a mulher encher
Chego em casa e dou um pau, se a mulher encher”
(Adaptado de “Quando a maré encher”, da Nação Zumbi)

“Preu comer seu c* falta uma polegada”
(Adaptado de “Meu maracatu pesa uma tonelada”, da Nação Zumbi)

“Ai, que saudade do Recifolia
Ai, que saudade dos velhos carnavais
(...) Meu abadá caiu no esquecimento
Ai, que saudade do cordão de isolamento”
(Paródia sobre o fim do Recifolia, carnaval temporão, atualizada pela pancadaria no Balança Rolha, quando uma multidão foi ao show de Ivete Sangalo que, em cima do trio, tentava em vão conter os ânimos.)

“Fafá, Fafá, Fafá, eu quero
Fafá, eu quero
Fafá, eu quero mamar
Dá essa teta...”
(Homenagem a Fafá de Belém)

“Eu te amo, Preta Gil, eu te amo
Da bateria de rainha vai pra p*** que p****
Eu te amo, Preta Gil, eu te amo
Ninguém segura a filha de Gilberto Gil”
(...)

Impagável.

obs.: O Blog do Tas
produziu e disponibilizou no YouTube um vídeo com trechos da prévia. A homenagem a Elba Ramalho é sensacional.